Poucos cravos, muitos lugares vazios nas duas principais bancadas. O ambiente de festa era mais notório nos lugares – todos ocupados – de BE, PCP e PEV. Depois de passados 43 anos sobre a Revolução de Abril, há quem se pergunte se ainda faz sentido o ritual da sessão solene no parlamento. A pergunta foi trazida para o hemiciclo pelo Presidente da República, que tem resposta pronta para quem tem dúvidas.
“Não seria preferível viver a data fora deste hemiciclo, junto de mais portuguesas e portugueses, num gesto de abertura da política a problemas concretos do cidadão comum, inovando nas ideias e ultrapassando a sensação de se estar a ver o mesmo, ainda que pessoas e circunstâncias fossem diferentes?”, perguntou Marcelo Rebelo de Sousa, que acha que nunca fez tanto sentido esta forma de celebrar o 25 de Abril.
“Faz sentido manter viva esta tradição. Hoje, mais do que nunca. Para mostrar que não nos esquecemos da nossa História e que há datas que não foram nem nunca serão indiferentes ao nosso destino coletivo”, frisou o Presidente, num discurso com menos recados políticos do que o do ano passado.
Em ano de eleições autárquicas, Marcelo preferiu não voltar a elencar os consensos de regime que pediu há um ano. Recados para o governo, só um. O mesmo que não tem parado de repetir e que pede mais crescimento económico.
“Os dois anos e meio que faltam para o termo da legislatura parlamentar terão de ser de maior criação de riqueza e melhor distribuição”, avisou, aproveitando apenas para uma crítica que quase passava despercebida nas entrelinhas do discurso quando avisou que o país continua “carecido de reformas”.
Convencido de que o país tem resistido à vaga de populismo que assola a Europa, Marcelo lembrou apenas que “os chamados populismos alimentam-se das deficiências, lentidões, incompetências e irresponsabilidades do poder político, ou da sua confusão ou compadrio com o poder económico e social”. E a isso os partidos precisam de estar atentos.
Apesar disso, o tom não foi de avisos. Marcelo acredita que o país já está em clima de pré-campanha para as eleições autárquicas de 1 de outubro e optou por um discurso de elogio aos portugueses e ao poder local. “Já disse e repito, o poder local foi e é um fusível de segurança singular da nossa Democracia”, afirmou.
Marcelo consensual
O tom foi tão neutro que este ano não mereceu sequer reparos de maior da direita à esquerda, com a maioria dos partidos a considerar que este ano o Presidente foi “consensual” – como disse Catarina Martins, “muito abrangente” – como apontou Jerónimo de Sousa – e “sensato” – como o classificou José Luís Ferreira do PEV.
Hugo Soares, do PSD, viu, contudo, uma farpa presidencial lançada à esquerda na alusão aos “cantos de sereia de amanhãs ridentes, em que do caos nascerá o paraíso”.
“O senhor Presidente da República falou nas ilusões perigosas que se podem tornar um caminho sem regresso”, interpretou Hugo Soares, que acha que o que Marcelo quis dizer foi que “as utopias perigosas pagam-se caro” e que “essa mensagem ficou muito clara”.
Antes, os elogios a Marcelo vieram do presidente da Assembleia da República.
Novidades no Parlamento
“Estou certo de que o senhor Presidente da República tem tido também aqui um papel decisivo nesta recuperação da confiança nas instituições da democracia, através da sua magistratura de proximidade, leal, lúcida e afetuosa. E sobretudo através do seu permanente respeito pela Constituição”, disse Eduardo Ferro Rodrigues, que dedicou o seu discurso à importância de reaproximar os cidadãos da política.
Com esse objetivo em mente, Ferro Rodrigues lembrou o trabalho que está a ser feito no desenvolvimento do projeto ‘Parlamento Digital’ e na comissão parlamentar que está a desenvolver propostas para aumentar a transparência e o combate à corrupção.
Entre as medidas anunciadas, está a criação de uma plataforma no site do parlamento para submeter petições e a simplificação dos requisitos para a apresentação de iniciativas legislativas de cidadãos e referendos. Além disso, Ferro anunciou a transformação do edifício da Casa Amarela num centro interpretativo sobre o parlamento, “com auditório, espaços interativos e livraria”.