O que o leva a voltar ao PSD nesta altura?
Já há uns tempos que estava a pensar voltar. Nesta altura, achei que tinha a obrigação de dar um sinal de apoio a Rui Rio, de quem sou amigo e com quem trabalhei muitos anos na liderança do grupo parlamentar. O PSD apresentou um excelente programa aos eleitores e julgo que é a altura certa para este gesto. O partido encontra-se numa situação difícil nas sondagens e isso também contribuiu para que manifestasse agora este meu frontal apoio a Rui Rio.
Encontra alguma explicação para os maus resultados do PSD?
Tudo se explica mediante uma série de circunstâncias complexas, mas a mais gritante verificou-se aquando da votação dos professores. Na altura, o PSD estava num empate técnico com o PS e de um momento para o outro, depois daquela trágica decisão à volta da contagem do tempo de serviço dos professores, começou o desgaste do PSD.
Foi um erro de Rui Rio?
Foi um erro do PSD e do CDS que lhes custou caro.
E foi bem aproveitado por António Costa…
Estão lá para isso. São profissionais e aproveitaram bem essa escorregadela do PSD.
Ainda é possível ao PSD vencer as eleições legislativas?
Acredito que é possível. Sei que é dificilíssimo, mas ainda é possível. Estamos a um mês das eleições.
Algumas pessoas no PSD manifestaram-se contra o seu regresso ao partido. Sente que esta decisão de regressar divide o partido?
Evidentemente que há quem não goste de mim porque fui sempre incómodo. Nunca tolerei certos jogos de poder. Nunca tolerei certos nepotismos. Nunca tolerei certas oligarquias.
Também não gostaram que tivesse apoiado o Partido Socialista…
Apoiei outro partido no período em que estive afastado do PSD. Com toda a legitimidade, entendi fazê-lo. Vendo as redes sociais e o meu email tenho mil vezes mais pessoas a dizerem que sou bem-vindo e a darem-me os parabéns do que propriamente críticas. Não conheço críticas ao meu regresso por parte de ninguém relevante no PSD. Mas também não teria apresentado o pedido de readmissão no partido se não tivesse a convicção de que as pessoas relevantes, para mim, apoiariam o meu regresso.
Foi crítico do Governo de Passos Coelho, nomeadamente por causa de algumas medidas de austeridade. Acha que o tempo lhe deu razão?
Não retiro nenhuma das críticas que fiz. Não apoiei Passos Coelho. Fui mandatário de Paulo Rangel, mas quer o programa dele, quer a prática política, desgostaram-me intensamente no sentido em que se inclinou para o neoliberalismo.
As políticas que foram aplicadas não se justificavam com a situação em que o país se encontrava?
Passos Coelho teve uma ação patriótica que reconheci publicamente. Essa ação patriótica foi ter salvo o país da bancarrota. Não ignoro isso. O problema é que depois aplicou uma dose de cavalo. Ia matando o doente com a cura. Depois atenuou as coisas para o fim do mandato e ganhou as eleições.
Mas apoiou o Partido Socialista…
O PS apresentou um programa social-democrata, mas não o aplicou. Porque assinou um papel com o PCP e o Bloco de Esquerda e as políticas relevantes, nomeadamente as reformas das leis eleitorais, que para mim é uma coisa decisiva, foram proibidas nesse acordo. Nunca me passou pela cabeça que António Costa pudesse chegar ao ponto de construir aquela solução com a configuração que construiu. Afastei-me pouco tempo depois…
Ficou desiludido?
Completamente. Desiludi-me com a prática política do PS, mas especialmente com o nepotismo e certos abusos que são preocupantes.
Arrepende-se de ter apoiado António Costa?
Não. Tinha aquela posição e não me coibi de o manifestar publicamente. Mas percebi que isto ía correr mal a partir do momento em que aquele papel foi assinado com os partidos da geringonça. Defendo de uma forma veemente a celebração de acordos de regime visando reformas estruturais que o país precisa. Mas isso só se consegue fazer quando o Partido Socialista e o PSD se entenderem.
Rui Rio tem sido muito criticado por defender acordos com o PS…
Rui Rio tem tido a coragem de defender isso e acho muito bem. O PS ficou refém da esquerda e parece que quer continuar. Do meu ponto de vista, esta solução foi prejudicial para o país e nenhuma reforma de fundo foi feita. Podia ter feito algumas reformas na segurança social, nos tribunais, na saúde…
Qual seria a solução ideal para os próximos quatro anos?
Se vencer as eleições, o PSD deve fazer uma coligação de Governo com o CDS. Se o PS ficar à frente, era preferível para o país que não se repetisse a experiência da geringonça e os socialistas pudessem governar em minoria.
É desejável um Governo entre PSD e PS?
Não. O PSD pode apoiar determinado tipo de medidas que entenda válidas para o país, nomeadamente as reformas estruturais que são urgentes, mas para a governação e para a gestão corrente o Partido Socialista que se desenrasque sozinho.
António Costa admite renovar estes acordos com a esquerda. Acredita que uma nova geringonça dure quatro anos?
Dificilmente. As ambições políticas do Bloco de Esquerda, por um lado, e a degradação eleitoral do PCP, que é notória, não auguram grandes perspectivas para a repetição dessa solução.
Rui Rio deve sair se o PSD perder as eleições?
A seguir às eleições temos um congresso. E é natural que se faça um balanço sobre o que se passou nas eleições. Rui Rio é quem deve decidir. Se o resultado for uma catástrofe total é uma coisa, se for um resultado honroso é outra, se for uma vitória honrosa é outra… Rui Rio está a prestar um serviço e não está agarrado ao poder. Julgo que decidirá tendo em conta os resultados eleitorais e o impacto que tiverem nos nossos militantes.
Já encerrou a vida política ou ainda admite voltar a ter uma participação mais ativa?
Não. Isso não. Tenho 74 anos. A pior coisa que me podia acontecer era ter de ir para Lisboa todos os dias de carro. De comboio, que era a coisa mais maravilhosa que tínhamos, não se pode ir porque o Partido Socialista… Fiz toda a minha vida profissional a utilizar aquele comboio e era fantástico. Agora está uma vergonha, uma coisa nojenta.
Ocupou vários cargos no PSD. Desde secretário-geral a líder parlamentar. Qual foi o cargo que mais gostou de exercer?
Nenhum outro militante do PSD tem o currículo que tenho. Tirando o cargo de Presidente da República e de primeiro-ministro exerci todos os cargos e não há nenhum um outro militante do PSD que o tenha feito. Não há nenhum outro militante que tenha dado ao partido o que dei. Podem ter dado o mesmo, mas não há nenhum que tenha dado mais, nomeadamente na implantação do partido. E, portanto, estranho que alguns militantes, que não me gramam, achem que o meu regresso é indesejável.
Que injustiças o PSD cometeu contra si?
Tem havido várias, mas isso não me preocupa muito. O cargo que mais gostei de exercer foi o de presidente de câmara [de Cascais]. Estava mais perto dos eleitores. Como líder parlamentar, por exemplo, estava relativamente afastado dos eleitores. Não só estamos perto dos eleitores como podemos fazer obra e concretizá-la. Podemos fazer obra útil aos cidadãos e isso é extremamente agradável.
Renunciou ao mandato de presidente da Câmara de Cascais em 2012. Teve pena de não ter ficado mais tempo à frente da autarquia?
Na altura tive um problema de saúde e tive mesmo que interromper o mandato.
A Câmara de Cascais ficou bem entregue a Carlos Carreiras?
A câmara está sempre bem quando é entregue aos que vencem as eleições. E, nesse sentido, está bem entregue.
Houve algum cargo que tenha pena de não ter exercido? Ainda se colocou, há alguns anos, a hipótese de ser candidato à liderança do PSD.
Não. Fui duas vezes desafiado [para me candidatar à liderança], mas achei que havia gente mais apta. Para ser líder, para além da disponibilidade, é fundamental ter vontade e não tive essa apetência. Tive enorme gosto em trabalhar como vice-presidente e como líder parlamentar… Comecei com Sá Carneiro e trabalhei com os que se seguiram a Francisco Sá Carneiro, como Mota Pinto ou Balsemão.
Foi depois secretário-geral do partido durante a liderança de Marcelo Rebelo de Sousa, mas as coisas não acabaram bem…
Começaram muito bem porque aceitei largar o Parlamento Europeu. Achei que tinha obrigação de corresponder ao convite de Marcelo. Partidariamente era a minha obrigação e como amigo pessoal, também. Em termos funcionais houve um desentendimento fatal, mas isso está ultrapassado.
O que aconteceu?
São questões de natureza burocrática. Não vale a pena estarmos a esmiuçar. Sou histérico da organização e do método e não gosto de ser ultrapassado. Sempre que fui secretário-geral foi a 200%. Desde fevereiro de 1975. Entrei em outubro de 1974 para o partido e Sá Carneiro, que era secretário-geral, designou-me como secretário-geral-adjunto. Logo a seguir fui eleito como secretário-geral em congresso e a partir daí estive oito anos no cargo.
Sá Carneiro é ainda hoje muito lembrado dentro do PSD. O que é que ele tinha de diferente?
Era uma pessoa extremamente carismática. Criava uma empatia de natureza política, mas também pessoal, fantástica. Era uma pessoa verdadeiramente extraordinária.
Era aquilo a que se chama um verdadeiro social-democrata?
Sem dúvida nenhuma. Uma das razões do meu afastamento relativamente a alguns setores do partido foi o facto de o PSD ter adotado posições neoliberais. O partido foi encostado à direita e conformou-se com isso. Acharam que essa coisa da social-democracia estava ultrapassada. Não penso assim.
É um partido de centro-direita?
O partido tem de se assumir claramente ao centro e tem de se associar à direita ou à esquerda para resolver os problemas do país. Quando Sá Carneiro propôs a coligação com o CDS foi chumbada. Teve de repetir a votação em Conselho Nacional e pediu, a mim e a outros dirigentes nacionais, para fazermos um périplo pelo país a explicar as vantagens políticas que a coligação podia proporcionar. O PSD não deve ter qualquer problema em associar-se ao CDS. Em Cascais, tive três maiorias associado ao CDS. Isso não invalida que dentro da coligação o PSD mantenha a sua raiz social-democrata.
Essa discussão ideológica, se o partido é mais liberal ou mais social-democrata, está por fazer dentro do PSD?
O que há no PSD são pessoas com uma visão mais liberal e mais à direita. Alguns afastaram-se e formaram novos partidos. Mas não acho que essa tenha sido a posição do núcleo duro de Passos Coelho. Passos Coelho foi confrontado com uma situação infernal. Chegou ao poder com o país à beira da bancarrota. Eu já tinha vivido uma situação parecida no Governo do Bloco Central.
Com Mário Soares como primeiro-ministro…
Sim. Tivemos de cortar o décimo terceiro mês da Função Pública. Reconheço que, naquela altura, o PSD tinha essa enorme dificuldade e conseguiu endireitar as contas. Mas o partido sempre foi interclassista. Mesmo em 1974 existiam militantes mais conservadores e mais liberais.
Voltando ao Presidente da República. Identifica-se com a forma como tem exercido este mandato?
Houve alguns exageros, mas desde o início que merece elogios. A forma como fez a campanha eleitoral. Fez uma campanha sóbria, sem cartazes e próxima das pessoas. Sempre o conheci assim. É de uma exuberância enorme na relação pessoal. Você não consegue apertar a mão a Marcelo. Tem de apertar a mão e dar um abraço. É exuberante no contacto pessoal. É extremamente inteligente e, portanto, tenho tudo a favor da forma como tem exercido o mandato.
Partilha da ideia de que o Presidente da República se excedeu no apoio ao Governo socialista?
Não. É equidistante.
Esperava que Marcelo tivesse tanta popularidade? Até chegar a Belém não tinha tido o mesmo sucesso na política…
Nunca tinha tido oportunidade para isso. Se Marcelo Rebelo de Sousa tem sido primeiro-ministro talvez tivesse a mesma popularidade. Foi líder do partido numa altura difícil. Teve agora oportunidade para demonstrar ao eleitorado como é pessoalmente e como exerce o cargo. É uma pessoa muito afável e vai a todas. Quando há um problema é o primeiro a chegar.
O que vê em Rui Rio que lhe dá a esperança de que possa ser um bom primeiro-ministro?
É uma pessoa frontal que não tem qualquer pejo em afastar os tabus de que não podemos fazer acordos de regime ou acordos estruturais com o PS, se for caso disso e se for do interesse nacional. É uma pessoa com uma seriedade a toda a prova e uma capacidade política que conheço muito bem. Trabalhei com Rui Rio e percebi a capacidade que tem, nomeadamente para uma área que vai ser fundamental que é a questão económica e financeira. Rio está habilitado para lidar com isso.
As pessoas ainda não perceberam as qualidades de Rui Rio? Ele precisava de mais tempo para se afirmar?
Precisava era de não ter tantas guerras internas como teve até agora. Tem mais oposição dentro do partido do que fora. Alguns órgãos de comunicação social também não têm ajudado. Só salientam os aspetos negativos. Tem tido um percurso muito difícil dentro do partido. A melhor maneira de se afirmar é ter um bom resultado nas próximas eleições.
Numa entrevista que deu, há cerca de dois anos, disse que os críticos lhe iam fazer a cama…
Tentaram fazer-lhe a cama mas Rui Rio é muito duro de roer. A oposição interna só começou a abrandar há 15 dias. Há artigos nos jornais, assinados por militantes do PSD, verdadeiramente escabrosos a descascar em Rui Rio. Ainda bem que Rio não faz o que fizeram a mim, que é participar ao Conselho de Jurisdição Nacional. Mas ainda bem que não faz isso.
Como é que vê estes novos partidos de direita?
Tenho boa impressão do líder do Iniciativa Liberal, mas é só uma boa impressão ainda a título preliminar, porque não conheço o programa e não o conheço pessoalmente. Mas, enfim, as duas ou três vezes que o ouvi achei interessante. Mas é um partido que não tem que ver com o PSD.
E o Aliança?
O Aliança não me agrada rigorosamente nada, porque não houve motivos objetivos para criar aquele partido. O que existiu foi um desejo de protagonismo e penso que não vai ter grande sucesso. Espero que não tenha sucesso nenhum. E do Chega é melhor nem falar porque de facto é um partido que, podendo não ser de extrema-direita, parece. E em política o que parece é.
Não deseja sucesso a Santana Lopes?
Se apoio Rui Rio não posso desejar sucesso aos concorrentes do presidente do PSD, especialmente àqueles que saíram e que, a meu ver, não tinham razões objetivas para sair.
Santana devia ter ficado no PSD?
Pedro Santana Lopes podia e devia ter sido candidato à Câmara de Lisboa. Aliás, não era inédito e já tinha ganho. Ganhou inesperadamente a João Soares. Não sendo candidato a Lisboa, decisão que respeito, penso que se não tivesse saído do partido era certamente cabeça-de-lista por Lisboa. Mesmo com espírito crítico em relação a Rui Rio podia ter sido cabeça-de-lista e ter tido um futuro político interessante.
Como vê o fenómeno do PAN, que entre os pequenos partidos é aquele que tem tido mais sucesso?
Vejo com interesse a atenção que é dada ao PAN. Começou por ser um partido amigo dos animais com exageros absolutamente caricatos. Aliás, foram gozados na comunicação social e nas redes sociais de uma forma muito engraçada. E depois enveredou pelas pessoas e inteligentemente pelo ambiente. É um partido novo. Vamos ver. Penso que é um nicho, digamos assim, que o presidente do PAN está a aproveitar bem e nas sondagens está a ter êxito. Diz que quer eleger um ou dois deputados, mas se as sondagens tiverem certas elege o dobro.