Menos de uma semana depois das eleições autárquicas, o Executivo sugeriu que todas as freguesias possam contar, pelo menos, com um membro a exercer funções a meio tempo, e esta proposta recebeu hoje, no parlamento, o apoio de PSD, BE, PCP, PAN, CDS-PP e PS, mas com algumas "ressalvas". “Passam a poder beneficiar deste regime [exercício do mandato a meio tempo] as 3.092 freguesias existentes no território, em vez das atuais 185”, disse a ministra da Modernização do Estado e da Administração Pública, Alexandra Leitão, na apresentação da proposta de lei do Governo, na sessão plenária da Assembleia da República, em Lisboa.
Frisando que a meta é “aprofundar a descentralização e transferir competências para as autarquias locais, mantendo como prioridade a promoção da recuperação e do crescimento da capacidade financeira das freguesias”, Alexandra Leitão explicou que a proposta em discussão tem como pano de fundo a vontade de que todas as freguesias tenham condições para o exercício dessas novas competências, inclusivamente garantindo que, pelo menos, um dos seus membros tem condições para exercer funções a meio tempo. “Esta medida, que será financiada pelo Orçamento do Estado, representa um investimento total de cerca de 29 milhões de euros já para o Orçamento do Estado de 2022, assim este diploma seja aprovado nesta casa a tempo, para o que conto com a colaboração de todos”, declarou a ministra.
A social-democrata Isaura Morais começou por criticar o ‘timing’ escolhido pelo Governo para a apresentação da proposta, “em véspera de eleições autárquicas”, discordando com a forma como o executivo “tentou interferir no processo eleitoral”, mas destacando que a alteração dos termos do exercício do mandato a meio tempo dos titulares das juntas de freguesia “é uma medida positiva”, ainda que o Governo possa “ir mais além”, aproveitando para rever outros critérios aplicáveis à administração local. A seu lado, o bloquista José Maria Cardoso avançou que “as freguesias como autarquias do poder local têm sido sucessivamente menosprezadas e é preciso dar dignidade no exercício dos titulares dos cargos”, propondo que as alterações para o exercício de funções a meio tempo possam também ser aplicadas para tempo interior, mas colocando “várias reservas” naquilo que concerne o processo de descentralização, por se tratar de “uma transferência de competências por via direta do município que se mantém nas mãos de um poder tantas vezes discricionário”.
Já para Paula Santos, do PCP, a proposta do Governo “é um passo para a valorização das freguesias, mas que é necessário muito mais”, como dotá-las dos meios necessários para que possam ter condições para o exercício das suas competências, recomendando a “possibilidade de as freguesias, passando a ter todas elas um regime de permanência a meio tempo, possam por sua opção também ter acesso ao tempo inteiro, suportando o remanescente, sem a limitação do número mínimo de eleitores”. À sua vez, a partir da bancada do PAN, Bebiana Cunha acrescentou que a proposta “é um caminho que já devia estar feito, tarda, mas importa que agora seja possível, por via do Orçamento de Estado”, abordando a possibilidade de as freguesias poderem complementar este meio tempo com o tempo inteiro, se assim os orçamentos disponíveis o permitirem, assim como uma reflexão sobre as tabelas de remunerações dos eleitos.
Do lado do CDS-PP Pedro Morais Soares, encarou “com agrado” a proposta do Governo, sem esquecer que “já vem é com quase quatro anos de atraso”, e alertou para a necessidade de corrigir desigualdades: “temos freguesias até 1.500 eleitores com uma dimensão muito significativa e temos freguesias com mais de 1.500 eleitores que até têm menos competência e menos área territorial do que outras”. Do PS, ouviu-se João Paulo Correia que salientou que “as juntas de freguesia são a face do Estado mais próxima dos cidadãos”, referindo que a proposta do Governo “permite que todas as juntas de freguesia do país possam ter direito a que um dos seus elementos esteja pelo menos a meio tempo, o que significa que o funcionamento da junta irá melhorar e as suas comunidades serão melhor servidas”, e destacando o “amplo consenso” que antecede a discussão na especialidade: “merece quase unanimidade pelas intervenções que já ouvimos”.
Por fim, Alexandra Leitão rejeitou as acusações da deputada do PSD, garantindo que a proposta de lei se aplica a todos os autarcas e reforçando que “é uma medida justa e é uma medida que não deveria convocar aqui considerações de outra natureza”. “A possibilidade de acertos na especialidade que tenham a ver com o alargamento da possibilidade de exercício de funções a tempo inteiro […] nas condições em que seja suportado pelas freguesias e de acordo com as regras de sustentabilidade financeira que lá estão, pois naturalmente que nada temos a opor, até esclarecendo que só metade é que será suportado pela freguesia, porque a outra metade não deixará de ser suportada pelo Orçamento do Estado, desde que enquadrada nestas condições”, finalizou.