"As empresas em Portugal serão proibidas de contactar os trabalhadores fora do horário de trabalho e têm de suportar os seus custos adicionais de energia e comunicações ao abrigo de uma das leis europeias mais favoráveis ao trabalhador para regulamentar o trabalho no domicílio", começa por explicar o jornal inglês Financial Times num artigo que publicou esta segunda-feira sobre o direito a desligar que foi aprovado no passado dia 3 de novembro pela Assembleia da República. Ou seja, uma das alterações ao Código do Trabalho que se baseia no direito a desligar dos trabalhadores no período de descanso, durante o qual os empregadores não podem contactar os mesmos.
“O empregador tem o dever de se abster de contactar o trabalhador no período de descanso, ressalvadas as situações de força maior”, pode ler-se na proposta do PS. “Constitui contraordenação grave a violação” do disposto neste artigo, explicaram os socialistas. Importa referir que, no mesmo artigo, consta uma norma que estabelece que “constitui ação discriminatória (…) qualquer tratamento desvantajoso, em matéria de condições de trabalho e de evolução profissional, dado a trabalhador pelo facto de exercer o direito estabelecido no número anterior”.
"Portugal proibiu os patrões de enviar mensagens de texto aos funcionários depois do trabalho. Isso poderia acontecer nos EUA?", questiona o também britânico The Guardian num texto publicado no mesmo dia. "Os países que protegem o direito das pessoas a um equilíbrio saudável entre a vida profissional e a familiar estão a responder de maneira adequada à cultura de trabalho moderna", continua, ressalvando que "Portugal não é o único país a modernizar as suas leis laborais; cidadãos de França, Espanha, Bélgica, Eslováquia, Itália, Filipinas, Argentina, Índia, etc. desfrutam do “direito de se desconectar” – ou se abster, sem punição, de trabalhar e comunicar com os seus empregadores durante os períodos de descanso designados", explicita. Recorde-se que outra novidade desta lei prende-se com a promoção dos contactos presenciais entre os trabalhadores e as chefias com intervalos não superiores a dois meses para que se possa “diligenciar no sentido da redução do isolamento do trabalhador, promovendo, com a periodicidade estabelecida no acordo de teletrabalho, ou, em caso de omissão, com intervalos não superiores a dois meses, contactos presenciais dele com as chefias e demais trabalhadores” segundo o PS.
Ainda que outros órgãos internacionais de informação tenham feito a cobertura deste tema, como a CNN ou a BBC, o primeiro a prestar atenção ao mesmo foi a agência norte-americana Associated Press. "O parlamento de Portugal aprovou na sexta-feira novas leis sobre o trabalho em casa, introduzindo proteção adicional para os funcionários que fazem o seu trabalho fora das instalações da empresa. As novas regras são uma resposta à tendência do aumento do teletrabalho durante a pandemia COVID-19, disse o governo socialista", avançaram no dia 5 de novembro, acrescentando que o Executivo "vê vantagens" em trabalhar em casa, mas deseja adaptar a legislação trabalhista a este regime. Por isso, "os regulamentos trazem novas penalidades para as empresas que perturbam a privacidade dos funcionários ou das suas famílias e obrigam-as a compensar os funcionários pelas despesas relacionadas ao trabalho em casa".
É também de referir que estas mudanças foram satirizadas no programa de televisão norte-americano The Daily Show, apresentado pelo comediante Trevor Noah. Descrevendo o direito a desligar como uma decisão "mesmo gangsta", indicou que “uma vitória dos trabalhadores em Portugal e na maioria da Europa é ilegalizar que o chefe nos contacte a partir das cinco da tarde. Entretanto, na América, uma grande vitória laboral é que agora os trabalhadores da Amazon podem escolher em que garrafas, de vidro ou plástico, querem urinar".