Num debate em que o Governo ainda está fresco, com pouco mais de um mês de vida, Luís Montenegro usou a estratégia dos anúncios para controlar o debate do Estado da Nação, o último da sessão legislativa, para controlar as longas horas de discussão parlamentar que se seguiram. Um aumento extraordinário de pensões, a ser pago em setembro, aos reformados que têm até 1.567 euros de pensão. A aprovação em Conselho de Ministros de uma nova proposta de descida de IRC de um ponto percentual todos os anos, até 2027, descendo dos atuais 20%, para os 17% em 2028. E o alargamento a todos os professores do ensino público, do apoio à deslocação de professores. Foram os três anúncios de peso feitos pelo primeiro-ministro no discurso de abertura.
O chefe do Governo chegou a este debate em vantagem, com apenas pouco mais de um mês da nova legislatura e no dia seguinte à aprovação no Parlamento de uma nova descida de IRS e com a aprovação, com os votos do Chega das novas leis de imigração.
Saúde o calcanhar de Aquiles
Sem novidade, foi aos problemas com o Serviço Nacional de Saúde que os partidos da oposição se agarraram para atacar o Governo.
Do Chega ao Bloco de esquerda, todos os partidos pediram explicações e respostas ao Executivo, para os problemas diários que o SNS enfrenta. Montenegro foi respondendo como pode, reconhecendo problemas, mas, tal como tem feito nas últimas intervenções, sublinhando o trabalho feito. «Não temos recursos humanos» foi dizendo Montenegro que garantiu que o Governo está a trabalhar em soluções para atenuar os problemas mais emergentes.
O debate sobre as questões de saúde foi também o momento escolhido para o primeiro-ministro dar um bónus ao recém-eleito líder do PS, José Luís Carneiro, anunciando que «o Governo vai aproveitar» a proposta do PS para criar uma unidade de coordenação para as emergências hospitalares.
Anunciada a boa vontade para acolher a proposta socialista, Montenegro concentrou-se em reforçar as prioridades já anunciadas por Ana Paula Martins, voltando a garantir que o Executivo está focado em garantir que haverá sempre uma urgência de obstetrícia aberta na península de Setúbal, para evitar que as grávidas se vejam obrigadas a terem de atravessar a ponte para encontrar assistência médica.
PS e Chega, quem casa com a carochinha
O tema das linhas vermelhas, aterrou de novo no debate parlamentar. Na linha do que tinha vindo a dizer nos últimos dias, José Luís Carneiro e outros deputados socialistas, aproveitaram o período de perguntas ao Governo para acusarem Montenegro de ter abandonado as linhas vermelhas em relação ao Chega.
Referindo-se às propostas de imigração aprovadas ontem com os votos do partido de André Ventura, Carneiro atirou a Montenegro, «alterar a política do não é não, para o sim é sim, traduzida na altivez do líder parlamentar: habituem-se. Não, não nos habituamos. O PS é a defesa da liberdade, da justiça, da igualdade e do humanismo» .
Às acusações dos socialistas, André Ventura respondeu com a confirmação de que tem um acordo com Montenegro, «eu e o primeiro-ministro chegámos a um acordo e não escondemos como o vosso líder atrás dos cortinados. Chegámos a entendimento sobre a lei de estrangeiros, IRS e a um princípio de acordo na lei da nacionalidade. Ser líder da oposição, não é ser líder da destruição, é querer o melhor para o país». Perante os argumentos que foram pontuando todo o debate, Montenegro e o PSD foram aproveitando para vincar a ideia de que são o partido charneira que negoceia com todos para garantir estabilidade para o país.
No final do dia nem socialistas, nem o Chega tiveram ganho de causa com a repetição de argumentos que se repetem legislatura após legislatura e a troca de argumentos sobre o ‘não é não’, ou o ‘sim é sim’ acabou por desviar as atenções dos dois maiores partidos em relação a temas que poderiam ter causado mais dificuldades ao Governo.
Imigração, habitação e educação
Além da saúde, os partidos à esquerda do PS elegeram os temas da imigração, habitação e educação para criticar o Governo.
Apesar do pouco tempo que teve para intervir, Mariana Mortágua aproveitou o tempo disponível para lançar uma das frases que marcou o debate. «Portugal teve o maior aumento do preço das casas na Europa e desde que há uma série estatística do INE. Não há dúvida de que o Luís trabalhou. Queria pedir-lhe que parasse de trabalhar para ver se conseguimos parar os preços da habitação». Um ataque que o primeiro-ministro não deixou sem resposta. «A Mariana ou não trabalhou, ou trabalhou mal», acusando o Bloco de Esquerda de não ter tido uma política de habitação nos tempos em que apoiou o Governo socialista.
O Livre apostou sobretudo em atacar o governo a propósito da política de imigração que acusa, decalcar as propostas do Chega, críticas em que foi muitas vezes secundado pelo PS.
Também as questões ligadas à educação e, sobretudo, os incidentes que levaram ao atraso na divulgação dos resultados dos exames do nono ano foram tema para perguntas dirigidas ao Governo.
O debate foi encerrado por Carlos Abreu Amorim, que se estreou numa intervenção como ministro dos Assuntos Parlamentares. Uma intervenção que aproveitou para esclarecer que a partir de agora o governo negoceia com todos, mas não vai negociar para empatar. PS e Chega ouviram o recado, resta saber se o entenderam.