Montenegro vai a Belém já com Governo na carteira

Montenegro começou a trabalhar num Governo diferente do que tinha imaginado. Agora, é preciso formar uma equipa capaz de ultrapassar o rubicão. E o primeiro teste é não partilhar as suas escolhas antes de falar com Marcelo.

Desde a madrugada do dia 11 de março, no final de uma noite eleitoral como há muito não se via, que Luís Montenegro não se avista. A indefinição de resultados que tornou difícil apurar o vencedor logo na noite eleitoral, trouxe uma vitória à tangente que agora é preciso saber gerir. Depois de anunciar ao país que espera ser convidado para formar Governo, o líder da AD fechou-se em casa a preparar o que pode ser a estrutura do seu Executivo.

A vitória por margem muito curta obriga a um realinhamento de estratégia, um Governo com prazo de validade imprevisível precisa de ser um Governo preparado para enfrentar eleições a qualquer instante, se e quando isso acontecer, Montenegro quer mostrar ao país que o projeto de mudança a que se propôs estava em marcha e foi interrompido por oportunismo político.

Para conseguir o objetivo, o líder da Aliança Democrática tem de conseguir formar um Governo politicamente muito forte e não pode desperdiçar nenhuma oportunidade. Nem sequer nestes tempos que antecedem o convite do Presidente da República e o anúncio das suas escolhas governativas.

Este é o grande motivo pelo qual Montenegro optou pelo recato. Nem o seu círculo mais próximo, vice-presidentes e secretário-geral incluídos, sabem o que vai neste momento na sua cabeça, nem quais vão ser ao certo as suas escolhas. O líder do PSD está a seguir em tudo a cartilha de Cavaco Silva, que também em 1985 teve que governar em situação muito semelhante. Foi um Governo de sucesso que lhe abriu a porta para a conquista de duas maiorias absolutas e 10 anos à frente do Governo.

O segredo é a chave do sucesso

Nesta tentativa de seguir a inspiração daquele que Montenegro diz ser a sua grande referência na política, a primeira lição está em prática, ninguém sabe ao certo quais são as escolhas ou o desenho de Governo em que Luís Montenegro está a trabalhar.

O recato da São Caetano à Lapa tem permitido ao líder trabalhar discretamente longe do centro político e das muitas especulações que circulam sobre os nomes dos futuros governantes.

Ao que sabemos, o puzzle de Montenegro está a ser composto com vários nomes para as diversas posições, mas ninguém pode dar nenhum lugar por garantido. Para esta operação minuciosa, o líder social-democrata terá pedido sugestões de nomes para várias áreas, e até sondagens sobre hipotéticas disponibilidades, mas não há nenhum convite feito.

Tal como Cavaco Silva, que em 1985 também se recolheu para fechar os seu primeiro Governo em absoluto sigilo, também Montenegro está a fazer o mesmo. Só depois da indigitação do Presidente da República para formar Governo é que Montenegro fará convites, e espera fazê-los num muito curto espaço de tempo, para controlar todo o processo no máximo sigilo até os nomes chegarem ao Palácio de Belém.

Também aqui Montenegro quer dar um primeiro sinal de mudança, depois de tempos muito conturbados politicamente, em que os nomes dos ministros e o próprio elenco do Governo de António Costa foram anunciados pelo Nascer do SOL e pelo i antes de chegarem a Belém. Da última vez, em 2022, Marcelo Rebelo de Sousa chegou a dispensar o primeiro-ministro da audiência em que lhe devia dar conta da composição de um Governo que já estava todo plasmado na comunicação social.

Montenegro está a tomar todas as cautelas para que desta vez não seja assim e o Nascer do SOL sabe que o sigilo vale para todos.

Nem os mais próximos têm informações seguras, apenas aspirações e/ou preocupações.

«Não tenho dúvidas de que o Luís já tem um Governo na cabeça, mas não o partilha com ninguèm», garantiu-nos um dirigente social democrata, «ele ouve muitas pessoas e aconselha-se, mas é muito solitário no momento da decisão e num tema como este, não me espanta que fique tudo fechado a sete chaves até à hora do anúncio público», acrescenta.

Peças chave de um Governo de combate

Com todas as dúvidas sobre nomes, há um cenário que é consensual, depois de conhecidos os resultados no dia 10, ficou claro que a composição do Governo teria de ser adaptada às novas circunstâncias políticas.

Uma opinião é consensual, este vai ter de ser um Governo muito mais político do que técnico e as peças chave para que as coisas possam correr bem serão o ministro(a) dos Assuntos Parlamentares, o líder parlamentar do PSD e o ministro(a) da Presidência do Conselho de Ministros. Por estas três figuras passará a gestão mais difícil: negociar permanentemente com as diversas forças parlamentares medidas e orçamento.

Com a Iniciativa Liberal de fora, Montenegro quer que o seu Governo tenha capacidade de negociação de banda larga, da esquerda à direita. O Chega não vai ficar de fora, mas IL, PS e Livre também não. O Governo da AD quer levar às várias mesas de negociação temas, que, pela sua própria natureza, dificilmente possam ser rejeitados pelos diversos partidos.

«Vai ser um Governo de pista preta, ou gelo fino», diz-nos alguém muito próximo da liderança da AD, numa referência às pistas mais perigosas do ski alpino.

«É um caminho difícil, mas não impossível, mas é preciso não fazer nenhum erro ».

De acordo com várias vozes ouvidas nos últimos dias pelo Nascer do SOL, logo nos primeiros dias de governo há várias decisões que têm que ser tomadas, como a eventual apresentação de um orçamento retificativo.

Se José Pedro Aguiar-Branco é dado como certo na presidência da Assembleia da República, e nomes como o de Teresa Morais terão de ficar para outros planos, Miguel Pinto Luz é apontado à liderança da bancada caso não assuma uma pasta ministerial (como a das Infraestruturas). Hugo Soares, Miguel Poiares Maduro, Gonçalo Matias, Leitão Amaro, Marques Guedes, Nuno Melo, Margarida Balseiro Lopes, Ana Paula Martins, Pedro Reis ou Miranda Sarmento são outros ministeriáveis. Já Paulo Rangel é aventado como provável comissário europeu, se não for para as Necessidades.