Pedro Nuno dispensou exclusividade a ex-CEO da TAP

Pedro Nuno Santos e João Leão aceitaram as condições de Christine Ourmières-Widener de manter funções noutras empresas. A aceitação está estampada no contrato da gestora e foi tema na Comissão de Inquérito da AR.

Está tudo no contrato que a TAP assinou com Christine Ourmiéres Widener, com o assentimento do Governo.  Os advogados da companhia aérea entregaram esta semana a alegação que contesta o pedido de indemnização da antiga CEO da TAP, por ter sido despedida com justa causa, na sequência do caso da indemnização a Alexandra Reis.

Na contestação, entre outros factos, os advogados alegam que «por mais que o exercício dos cargos na ZeroAvia e MetOffice pudessem ter sido autorizados pelas rés ou pelos seus acionistas, é manifesto que a autora nunca informou ou sequer solicitou qualquer autorização às rés e aos seus acionistas para manter o cargo de administradora da O&W Partners, enquanto exercesse o caso de CEO das rés».

Ora, o facto é que no contrato de Christine está explícito, na cláusula 9.2 : «A CEO garante ainda que, no momento da sua nomeação como CEO, não está atuando em nenhum conselho de CEO ou conduzindo qualquer trabalho de consultoria, exceto ZeroAvia e MET Office, em relação a este último, na medida em que apenas o trabalho de consultoria do CEO não representa qualquer conflito potencial ou real com as responsabilidades do CEO  neste acordo ou com os interesses comerciais da empresa do grupo».

A cláusula do contrato deixa claro que a acusação de violação do dever de exclusividade da antiga CEO da TAP não lhe poderá ser imputada, mas antes aos responsáveis políticos que concordaram com esta condição. A qual , ao que o Nascer do SOL_apurou, Ourmiéres-Widener colocou como indispensável para aceitar o lugar aquando da entrevista com a empresa de recrutamento.  Ainda assim, Pedro Nuno Santos concordou em entrevistar a ainda candidata e a decisão final foi tomada pela tutela.

O contrato que, ironicamente, foi assinado por Ramiro Sequeira e Alexandra Reis, à data membros do Conselho de Administração da TAP, foi anteriormente validado pelos responsáveis governamentais que tinham este dossiê em mãos: Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas, e João Leão, ministro das Finanças.

Quando o contrato chega à TAP, já vem finalizado e validado pela tutela. O tema que ao longo da semana gerou polémica e levou o PSD_a pedir novas explicações a Pedro Nuno Santos, foi exaustivamente tratado na Comissão de Inquérito. Questionada sobre a exclusividade de funções, a gestora respondeu: «Tenho duas outras funções que foram aprovadas pelo Governo quando entrei para a empresa». E especificou: «Sou uma não executiva do MetOffice, a empresa meteorológica britânica, sou membro do Conselho de Administração de uma empresa americana que está a desenvolver uma solução de propulsão de hidrogénio. Isso foi revelado quando entrei».

Para a antiga CEO e para a sua defesa, a questão da exclusividade não é uma questão, tanto assim que, na mesma audição, sublinhou: «Assinei um contrato revisto por um advogado pelo que, espero, esteja conforme com a lei. Se tive a aprovação do Governo, imagino que esteja em conformidade».

Resta um detalhe na alegação que diz respeito à atividade na empresa O&W Partners, uma empresa que é detida por Christine Ourmières-Widener e pelo marido e que consta nas informações de perfil que a ex-CEO tem no seu perfil de Linkedin e na sua entrada na Wikipedia. Trata-se de uma empresa familiar, essencialmente sem atividade.

Pedro Nuno sabia e autorizou

Questionado pelo PSD e pelos jornalistas, o agora secretário-geral do PS não quis dar esclarecimentos, argumentando ainda ontem: «É um litígio entre duas partes em que não estou envolvido». Mas a verdade é que o próprio contrato e o seu clausulado provam que Pedro Nuno Santos soube e autorizou que Christine Ourmiéres-Widener passasse ao lado da imposição de exclusividade a que o estatuto de gestor público obriga.

O tema era tão pacífico que, já em funções, a CEO é convidada pelo Governo francês para ser conselheira comercial. Na comissão de inquérito,  Christine Ourmières-Widener firmou: «Quando fui convidada para ser conselheira comercial de França tive uma conversa com o secretário de Estado das Infraestruturas, Hugo Mendes. Ele fez-me perguntas sobre o que era esse trabalho, expliquei-lhe que era um trabalho em que se analisa a forma de melhorar a relação comercial entre os dois países… Hugo Mendes disse-me: ‘Está bem, eu compreendo, não vejo qualquer objeção’».

Juntamente com o próprio contrato feito com Christine Ourmières-Widener, os factos relatados em sede de Comissão de Inquérito não deixam dúvidas de que era consensual que a CEO_não estava obrigada pela tutela a respeitar as regras do estatuto de gestor público.

Esta questão só veio a constituir um problema quando, depois da demissão de Pedro Nuno Santos, João Galamba tomou posse da pasta das Infraestruturas e pediu expressamente a Christine Ourmières-Widener que se demitisse do cargo: «Depois, quando fui eleita, foi com João Galamba que decidi pedir um parecer legal sobre isto. E ele enviou-me uma mensagem dizendo-me: ‘Verificámos que não funciona, tem que se demitir’. E eu demiti-me imediatamente».

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