OE 2023. Oposição atira com estabilidade no “empobrecimento” e “estagnação”

Direita fala em crescimento insuficiente. PCP e BE criticam “borla fiscal” aos grupos económicos. Livre e PAN vão ser mais exigentes nas negociações.

por Joana Mourão Carvalho e José Miguel Pires

Os partidos nem deram tempo que acabasse a tradicional conferência de imprensa do Ministro das Finanças e começaram a disparar as primeiras reações à proposta de Orçamento de Estado para 2023 do Governo, com uma mensagem comum: este documento conduzirá ao “empobrecimento”.

As primeiras impressões não partiram do Parlamento, mas sim de Évora — onde o líder do PSD, Luís Montenegro, prossegue no seu périplo distrital, acompanhado pelo líder da bancada parlamentar. Joaquim Miranda Sarmento foi rápido a dizer por que razão o partido não precisou de ouvir as explicações de Fernando Medina até ao fim: “É um Orçamento que traz poucas novidades em linha com a política económica dos últimos sete anos”.

Apesar de os sociais-democratas terem encontrado no documento “muitas promessas, medidas e programas”, não viram nada mais virado para a “competitividade da economia e para a produtividade” que o partido desejaria.

Reconhecendo, contudo, que o acordo de Concertação Social “é benéfico para o país”, Miranda Sarmento criticou o Executivo socialista por não ir mais longe e manter uma política económica que “não traz crescimento” e que “continua o empobrecimento a que o país tem assistido nos últimos anos”, que agora será “generalizado para a maioria dos portugueses”, dada a perda de poder de compra.

Em sintonia, o Chega classificou a proposta de Orçamento como “francamente insuficiente”, principalmente ao nível fiscal, e que contribuirá para a “estagnação” do país.

“O Governo preferiu apresentar um pacote de medidas que terá um impacto reduzido no próximo ano”, criticou o deputado Filipe Melo, apontando que para fazer face às dificuldades dos portugueses seriam necessárias medidas de redução do IVA nos bens essenciais, bem como a redução nos impostos sobre os combustíveis, além de uma isenção de tributação dos subsídios de férias e de Natal, uma das medidas bandeira do Chega para este OE.

Em vez disso, no imediato, não há “nada de novo, é mais do mesmo”, resumiu, antevendo ainda um cenário de recessão, que para já é rejeitado pelo Governo.

Do lado da Iniciativa Liberal, o discurso foi quase idêntico. A deputada Carla Castro descreveu o documento como “mau”, devolvendo a máxima da estabilidade tão apregoada pelo Executivo socialista como uma crítica.

“O orçamento que dizem que é de estabilidade, sim, mas na estagnação e na sobrecarga fiscal” atirou.

Os liberais acreditam que este “não é o orçamento que o país precisa, não é o orçamento de crescimento” e, por essa razão, o voto contra do partido, tal como da restante direita, está praticamente garantido.

“Um Orçamento que nasce socialista dificilmente vira liberal”, ironizou.

 

À esquerda a sentença é a mesma

Também à esquerda, as críticas ganharam força tanto por parte do PCP como do Bloco de Esquerda.

De um lado, os comunistas, pela voz da deputada Paula Santos, criticaram a proposta do OE2023 por não contribuir para o “desagravamento das desigualdades”, sendo unicamente benéfico para os grupos económicos.

“Quando era necessário recuperar o poder de compra perdido, o Governo apresenta exatamente o contrário”, apontou a líder parlamentar comunista, frisando que “o Governo se submete aos ditamos da UE, aos critérios do euro e às cedências dos grupos económicos” e que “as contas certas são só para os grupos económicos”, que “são os únicos que beneficiarão”.

Para os comunistas, esta é uma proposta de Orçamento que contribui para “agravamento do empobrecimento”, para as “injustiças fiscais” e que tem um “investimento público muito insuficiente”, não dando qualquer confiança para o futuro mas, em sentido contrário, “comprometendo-o”.

“É um Orçamento que, face à realidade que vivemos no nosso país de agravamento das condições económicas e sociais, de aumento de preços de bens essenciais e de aproveitamento por parte dos grupos económicos, não dá a resposta que é necessária”, continuou Paula Santos.

Por sua vez, Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, centrou o seu discurso num ponto: a acusação de que esta proposta da OE faz os trabalhadores “perder um mês de salário por ano”. Foi, aliás, este o argumentou que utilizou para sugerir que os bloquistas não votarão a favor da proposta em questão.

“O que fariam os senhores jornalistas com um OE em que os trabalhadores perdem um mês de salário?”, questionou a bloquista depois de considerar que “este é um OE que determina o empobrecimento de quem trabalha”.

Mariana Mortágua criticou ainda a “borla fiscal” que o Governo dará aos patrões, recordando o caso do Novo Banco, que “teve nos últimos cinco anos seis mil milhões de prejuízos” que “podem agora ser deduzidos aos lucros ‘ad aeternum’”.

“É um Orçamento desequilibrado e que não garante nenhuma atualização salarial, pelo contrário, é a garantia de perda de rendimento por parte de quem trabalha”, sintetizou Mortágua.

Como era de esperar, no entanto, os socialistas apareceram sozinhos a apoiar a proposta do Governo. Pela voz da deputada Jamila Madeira, o PS considerou tratar-se de uma proposta de Orçamento de Estado que “dá resposta aos problemas e preocupações dos portugueses” e que resulta de “um diálogo histórico conseguido com os parceiros sociais”.

“É também um orçamento mais forte e mais robusto sem deixar ninguém para trás, traduz estabilidade, mas também prudência dada a conjuntura internacional. É feito com a preocupação de manutenção dos rendimentos dos mais frágeis e mais vulneráveis, mantendo Portugal na rota de convergência com a União Europeia”, garantiu, argumentando tratar-se de uma proposta “com estabilidade, confiança e compromisso”.

“Os portugueses podem ter as suas expectativas bem desenhadas. Ajustaremos de acordo com as dificuldades, mas estamos aqui para continuar a aumentar rendimentos, para aumentar a capacidade de investimento das empresas”, garantiu a vice-presidente da bancada socialista, para quem este é um orçamento “da transparência”.

 

Aliados mais exigentes

Os parceiros com que o Executivo tem negociado e que viram algumas das suas propostas incluídas no último Orçamento do Estado, desta vez, não prometem fechar os olhos. Pelo Livre, Rui Tavares avisou que, para já, o Governo não conta com um “voto favorável à partida” e que o partido vai ser mais “ambicioso” . E colocou já duas propostas em cima da mesa: um passe ferroviário nacional e o transporte escolar.

Falando num “desencontro de estratégias” entre o Livre e o Governo, o deputado único lançou ainda no ar a possibilidade de vir aí uma correção das contas orçamentais a meio do ano, sob forma de um novo orçamento retificativo.

Por seu lado, o PAN mostrou-se insatisfeito com o abandono de programas como o housing first neste Orçamento, uma das bandeiras do partido, cuja execução nem sequer chegou a ser cumprida em 2022.

Com dúvidas em relação à revisão dos escalões do IRS, Inês Sousa Real criticou ainda a falta de resposta em relação a transportes públicos e a ausência de apoios referentes aos animais de companhia. Sobre o sentido de voto do partido, disse estar “tudo em aberto”.